Homem conta sua rotina como refém da Al Qaeda por quase 6 anos
Não perca DESAPARECIDOS. TODA QUARTA, às 23h15.
Ele planejava viajar pela Europa e pela África por seis meses antes de voltar à sua terra natal, mas seus planos foram interrompidos pela ação de um dos grupos terroristas mais temidos do mundo.
Em outubro 2011, Stephen McGown deixou sua esposa e seu apartamento em Londres, no Reino Unido, a bordo de uma moto. A ideia era viajar pelo belo interior da França e da Espanha até chegar a Gibraltar, onde atravessaria para o Marrocos até chegar ao destino final, Burkina-Fasso.
Seria uma espécie de “aventura da vida” antes de retornar de vez com a esposa para Joanesburgo, na África do Sul, onde queria montar um negócio e, futuramente, ter filhos.
A aventura estava dentro dos conformes até a etapa final. Depois do Marrocos, McGown deveria seguir o plano original e se dirigir para o Burkina-Fasso, mas de última hora resolveu mudar o trajeto e conhecer melhor o Mali, país cravado em meio ao deserto saariano.
A decisão não foi feliz. Dias depois de chegar à capital, Tombuctu, foi raptado por um grupo de jihadistas do Al Qaeda enquanto descansava em um hotel local.
McGown foi levado junto com outros reféns no porta-malas de um carro até o meio de deserto, numa viagem que durou mais de 15 horas.
A rotina no cativeiro era repetitiva: acordava antes do sol raiar, fazia uma oração junto com os jihadistas e tomava um café da manhã bem simples, composto basicamente de pão e leite em pó. Alguns reféns voltavam a dormir enquanto outros podiam fazer exercícios – para isso dispunham de uma área do tamanho de um campo de futebol.
O almoço era quase sempre espaguete ou arroz acompanhado de alguma carne.
Boa parte dos dias os reféns passavam dentro de cabanas, lendo e recitando o Alcorão.
Eles eram continuamente vigiados por 17 jihadistas que portavam armas e granadas. À noite, eram acorrentados. A cada duas semanas o acampamento mudava de local. Tentar fugir era inútil, já que provavelmente não sobreviveriam por muitos dias sob o clima impiedoso do deserto.
Ao receber a notícia do sequestro, o pai de McGown, Malcom, acionou a polícia sul-africana Só que, para piorar, dias depois o Mali passou por um golpe de estado e as buscas tiveram que ser suspensas.
Poucos meses depois, McGown resolveu se converter ao Islã. Era uma tentativa de criar mais empatia junto aos sequestradores e conseguir tolerar melhor a vida no cativeiro. Funcionou.
"Eu era cristão e muitas das histórias do islã são as mesmas. A religião me deu estabilidade no deserto", disse ele.
Enquanto isso, sua esposa, Catherine, voltou para Joanesburgo e tentava levar a vida adiante. O pai de McGown continuava tentando negociar com os sequestradores, sem sucesso.
Em junho de 2015, uma esperança: a Al-Qaeda divulgou um vídeo em que McGown aparecia vivo. Os sequestradores estavam dispostos a conversar.
Foi um longo vai e vem de informações até que, em junho de 2017, McGown encarou uma viagem de dois dias pelo Saara rumo à sua libertação. O carro parou em uma estrada nas proximidades da cidade de Gao e o motorista disse apenas “Você está livre”.
Em 29 de julho de 2017, depois de uma série de exames, ele finalmente pôde voltar a Joanesburgo. "Vi meu pai de dentro do carro e meus olhos se encheram de lágrimas, não podia acreditar."
Quando finalmente pôde abraçar seu pai, descobriu que sua mãe havia morrido poucos meses antes.
O reencontro com Catherine também foi emocionante. "Ele estava muito diferente, mas tinha o mesmo sorriso largo", diz ela.
O motivo da libertação de McGown não é claro. Fontes dizem que o governo sul-africano teve que pagar quase 5 milhões de dólares aos sequestradores – o que eles negam.
O maior desafio de McGown agora é voltar à vida normal. Ele está com dificuldades de falar inglês, de se socializar e de cobrir quase seis anos de ausência.
Fonte: G1
Imagens: BBC/Arquivo pessoal